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Carta / Força 13 - Iribá ou Ibiracy, a mãe das árvores

13. Iribá, a Vida Morte Vida\Maria Lalla Cy Aché
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Ibiracy.jpg

Música: Rui Pereira, Maria Lalla Cy Aché, Pedro Herzog e Maria Eugênia

 

Coreografia: Maria Lalla Cy Aché & Ana Cláudia Waechter

Introdução: G2 G/5- G2 G2

G                                      Em

Eu agradeço a Mãe Terra

 G

Que sustenta o meu caminhar       

  F                             Em                F

Toda mulher é como uma árvore

       C                  G

A florir e frutificar

G                              Em   F   G                                 Em

Onde termina a viagem, ou será transformação

G                                   Em        F                                       G

Ponte, meio ou passagem, início ou fim de estação

G                         Em  F       G                         Em

Toda terra é sagrada, a morte não é o fim

G                              Em            F                       G

É como o voo infinito, na quietude de mim

G                              Em            F                       G

É como o voo infinito, na quietude de mim

Capítulo 13 – Ibiracy, a Mulher Árvore “Esta é uma história muito antiga que me encantou, contada por Ximena Noemí Ávila Hernández; que antes de aparecerem os humanos de duas patas na Terra, todas as mulheres, antes de serem mulheres foram árvores, tinham raízes que as faziam ser uma com a Mãe Terra, mãos compridas e ressecadas feitas de troncos e cascas, e compridos cabelos que se cobriam de folhas, flores, frutos e pássaros que cantavam na primavera. Elas viviam nos recantos mais belos, nutriam-se do sol, da água, do vento e nunca estavam sozinhas, pois estavam rodeadas por todas as criaturas do bosque tanto terrenas como todas as criaturas mágicas que possas imaginar. Também eram cuidadas e nutridas pela árvore mais sábia de todas, à que chamavam “Avó Árvore”, uma árvore tão antiga que conhecia todos os segredos sobre a vida e sobre a morte. As Mulheres Árvore tinham muitos poderes, comunicavam-se sem usar as palavras, moviam os elementos sem ter mãos e podiam sentir a todos os seres da natureza através da rede profunda que formavam com as suas raízes por debaixo da terra. Um dia, começaram os tempos de guerra, mortes e destruição, alguns dizem que a causa foi a ambição pelos reinos, pelo poder e pelas riquezas. Foi uma época terrível, onde muitas Mulheres Árvore foram convertidas em madeira e queimadas como forma de gerar calor. Com estes acontecimentos, para poder manter vivas as suas filhas, a Avó Árvore permitiu que se desenraizassem e ganhassem pés para que pudessem correr e esconder-se longe de perigo. Assim, as Mulheres Árvore tiveram que aprender a caminhar e a sobreviver sozinhas, em troca perderiam as suas raízes e o seu vínculo com a Mãe Terra e todos os seres que nela habitavam, o que lhes causava uma grande dor e tristeza, mas era a única forma de sobreviver e conservar a tradição das Mulheres Árvore. Então, a Avó Árvore, com o desejo de nunca mais separar-se deste bosque de donzelas e num ato de amor profundo pelas suas filhas, abençoou todas as mulheres com uma árvore no seu ventre, e esta árvore transformou-se no que hoje é o nosso útero. Assim todas as mulheres podem recuperar o seu enraizamento à Mãe Terra nutrindo-se do seu amor, pois o útero é o vínculo com a sua verdadeira essência. No seu centro está a forma de como recuperar a razão primogénita do que é ser mulher. E o maravilhoso da bênção da Avó Árvore é que tenhamos ou não um útero físico, sempre teremos um útero energético que ninguém nunca nos poderá arrebatar. Esta é uma história muito, mas muito antiga, porém muitos dizem que nestes momentos a Avó Árvore está a fazer um chamado forte e claro às suas filhas. Assim quando abraçares a árvore mais antiga da floresta e apoiar o teu ouvido no seu tronco, este contarte-á os segredos das Mulheres Árvore, vai impregnar-te de todo o seu amor e vai outorgar-te toda a sua medicina ancestral. Nunca mais voltarás a estar desconectada da tua Avó Árvore. O teu útero recuperará as suas raízes e caminharás para sempre vinculada com a terra.”

 

Esta árvore que está em nosso útero nos conecta com a vida e a morte. Quando damos nascimento à uma criança, estamos no mesmo instante condenando-a à morte. Isto porquê a natureza da vida-morte-vida é uma só. É através da observação e da comunhão com as árvores que aprendemos sobre a natureza cíclica. Esta é uma das faces misteriosas do Divino Feminino que precisamos honrar. Recentemente li sobre a criação de ovos biodegradáveis que serviriam como caixões para os nossos corpos quando morrermos. Na sequência, seríamos enterrados dentro deles e ali se plantaria uma árvore que cada um escolheria para ser lembrado. Se adotarmos essa prática transformaremos os cemitérios em Florestas. Nada mal. Na verdade, transformaríamos cemitérios em Juremares, onde poderíamos nos conectar com a sabedoria dos nossos ancestrais. Diferentemente de animais mortos ou mesmo árvores cortadas pelo homem, quando vemos uma grande árvore morta, em pé, no meio da mata, não sentimos tristeza ou pena, mas a satisfação de ver o fim de um ciclo vitorioso cumprido com força e humildade, características próprias de grandes seres vivos. Grandes árvores não são apenas seres vivos, alimentando-se da terra, elas fornecem todo tipo de auxílio à Natureza. Apesar de roubar uma grande área de luz solar, indispensável às plantas, suas copas transformam-se em um pequeno mundo, com milhares de pequenas plantas, dezenas de pequenos animais, milhões de insetos, anfíbios, etc. Seus frutos, sementes e flores fornecem alimento para animais de todo o tamanho, desde insetos até elefantes, no caso da África e Ásia. Durante as chuvas, essas árvores chegam a recolher milhares de litros de água, mantendo o solo baixo livre de erosão e com temperatura constante, ideal para que todo tipo de seres vivos possa se manter com um habitat constante e previsível. E as folhas descartadas são mantidas para que se transformem em húmus, depois de serem decompostas por todo tipo de fungos e líquens, as máquinas recicladoras da natureza. Porém, um dia, as árvores começam a morrer, então o que poderia ser um desastre se transforma em um grande berçário, com tocas em seu tronco, ideal para ninhos de pássaros e roedores. A Amazônia contém uma grande variedade de espécies, boa parte delas sequer foi descoberta e que já corre o risco de desaparecer. Os desmatamentos criminosos continuam aumentando a cada dia, condenando a Vida à Morte de milhares de espécies. Ouvi que as araras azuis estão em perigo de extinção por que um determinado tipo de árvore onde constroem seus ninhos estão ficando raras. Nascer de uma pequena semente, viver durante centenas ou até milhares de anos em silêncio, servindo aos outros comida e proteção, sem pedir nada em troca, apenas que espalhem sua semente. Durante seu ocaso, manter-se útil e necessária para a vida e finalmente depois de seu fim, abrir uma clareira na mata possibilitando que novas plantas recebam a luz do sol e ainda transformar-se em alimento para novas vidas, esse sim é um exemplo que deveria ser seguido por todos os seres humanos. Quando nos aproximamos da natureza com respeito, humildade e entrega, ela compartilha muitos de seus segredos. Dizem que todas as respostas estão dentro de nós e sinto que elas podem ser acessadas com bastante facilidade quando estamos entre árvores, rios, mares, animais, flores. Ao observar os ciclos da natureza de vida-morte-vida, compreendi definitivamente o que significa o velho adágio: “não há mal que sempre dure, nem bem que nunca se acabe”. Porque a transformação constante é necessária à manutenção de toda vida. É preciso aceitar a transformação. Observando a natureza cíclica, percebemos como nossos próprios corpos e toda a vida em nosso entorno, tudo, absolutamente tudo, passa por nascimento, plenitude e declínio, seguido de um renascimento e assim por diante. Neste exato instante milhões de células da sua pele morrem e outras tantas nascem, num milagre cotidiano. Foi apenas quando compreendi esses ciclos de vida-morte-vida que entendi que morremos e nascemos várias vezes na mesma vida. São muitas mortes que temos de enfrentar de projetos, relacionamentos, vínculos, modo de fazer certas coisas, enfim, quantas dessas situações chegam ao seu clímax e precisam naturalmente caminhar para seu fim. Amor e morte estão relacionadas à criação e destruição, intimamente ligados a toda experiência humana. Morte e gozo fazem parte da trama que tece o amor humano. Eros e Tanatos, as duas faces da mesma moeda, pois a morte está sempre à sombra do amor. O lado trágico da vida dimensiona a grandeza da experiência amorosa.

 

Para Clarissa Pinkola Estés, autora do Best Seller “Mulheres que correm com os Lobos”, amar significa emergir de um mundo de fantasias para um mundo real, onde o amor duradouro é possível. O que morre? As ilusões, as expectativas, a voracidade de querer tudo, de querer que tudo seja lindo, tudo isso morre. Como o amor sempre provoca uma descida até a natureza da morte, podemos perceber por que é preciso grande poder sobre si mesmo e plenitude da alma para assumir esse compromisso. (...) “Às vezes aquele que está fugindo da natureza da vida-morte-vida insiste em pensar que o amor é apenas uma dádiva. No entanto, o amor em sua plenitude é uma série de mortes e de renascimentos. Deixamos uma fase, um aspecto do amor, e entramos em outra. A paixão morre e volta. A dor é espantada para longe e vem à tona mais adiante. Amar significa abraçar e ao mesmo tempo suportar inúmeros finais e inúmeros recomeços — todos no mesmo relacionamento.” ― Clarissa Pinkola Estés, autora de “Mulheres que correm com os Lobos”, Mitos e

Histórias sobre o Arquétipo da Mulher Selvagem “É bom adotar a prática diária de meditar sobre a natureza da vida-morte-vida.

 

• Ao que eu preciso dar mais morte hoje, para gerar mais vida?

• O que eu sei que precisa morrer, mas hesito em permitir que isso ocorra?

• O que precisa morrer em mim para que eu possa amar?

• Qual é a não-beleza que eu temo?

• Que utilidade pode ter para mim hoje o poder do não-belo?

• O que deveria morrer hoje?

• O que deveria viver?

• Qual vida tenho medo de dar à luz?

• Se não for agora, quando?”

 

Desde que conheci a natureza da vida-morte-vida, nunca mais joguei sementes fora, guardo e seco as sementes daquilo que como, e me transformei numa plantadora de árvores. Hoje foi dia de espalhar sementes de limões galegos. Já tenho pequenas mudas de várias árvores que doo para os amigos que tem sítio ou planto pelas ruas aqui de Laranjeiras, bairro em vivo no Rio de Janeiro, onde por sinal nunca encontrei uma só Laranjeira. Vou plantar uma em algum lugar protegido e acessível para todos, coisa difícil de achar numa cidade.

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